O meu avô Luís, pai
da minha mãe, celebraria hoje o seu 95º aniversário. Era dois anos e dois dias
mais velho que a minha avó Cristina, sua esposa.
O meu avô era um
homem com um ar sereno, quase imperturbável, com uma voz suave e amistosa, cujas
feições eram vagamente semelhantes às do Almirante Gago Coutinho, o que me fazia teimar
em dizer que a imagem na nota 20$00 era a fotografia do avô. Quando eu era pequeno
chamava-me ternamente “Russico” por eu ter o cabelo claro.
Como a grande maioria
das pessoas da sua época, viveu grandes dificuldades para sustentar e criar os
cinco filhos, fazendo das tripas coração para que não passassem fome. Teve uma
vida dura, tendo chegado a trabalhar nas minas de carvão e mais tarde numa
cerâmica a 5 km de sua casa, cujo trajecto fazia diariamente a pé. Saía de casa ainda de
noite acompanhado pelo seu candeeiro a petróleo palmilhando as estradas e os
caminhos que o voltavam a ver novamente à noite no regresso.
Sinto-me um
afortunado por ter tido o privilégio de conviver diariamente com ele até aos
meus 15 anos, altura em que ele partiu. Tenho tantas saudades de o ver sentado
virado sobre o braço do sofá a jogar comigo às cartas, à bisca
de 3, que ele próprio me ensinou a jogar, deixando-me ganhar quase sempre só para
me ver feliz. Sinto também a falta do seu carinho, manifestado discretamente
pela sua personalidade introvertida, e daqueles rebuçados de mentol ou do Dr.
Bayard, que dados por si tinham sempre um sabor especial.
Admiro para além de
tantas coisa a sua capacidade de sofrimento, os seus últimos três anos de vida passou-os
acamado, após ter-lhe sido amputada uma perna, praticamente imóvel mas com as
suas capacidades mentais intactas. Não me lembro de ouvir a sua voz calma
protestar ou queixar-se das infelicidades ou doenças de que padecia. Era um
resistente e era um Homem bom.
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